Diário dos tratamentos

1.a tentativa – FIV

Novembro de 2017. Este é o mês que marcou um banho de realidade e que pela primeira vez tive a consciência real e crua que isto pode tudo falhar…

Mas vamos por partes.

Em setembro tive a primeira consulta no HUC onde nos foi dito que tinhamos sido aceites para um tratamento de Procriação Medicamente Assistida (PMA) e que a técnica a aplicar seria a FIV – Fertilização In Vitro. Bacisamente consiste numa estimulação da ovulação, depois são retirados os ovócitos, colhido esperma e a fecundação é feita em laboratório. O embrião é então colocado no útero e depois… é rezar aos anjos e santos.

No dia 13 de novembro iniciei o ciclo do tratamento. Na primeira consulta foi-me receitada medição para estimular a ovulação via subcutânea, que é como quem diz, ter de dar injeções na barriguinha. Na segunda consulta foi adicionado um outro medicamento para impedir a ovulação, para dar mais tempo para a formação de folículos. Como se não fosse deprimente o suficiente andar a dar injeções na barriga todos os dias, aumentamos a dose e passamos a dar DUAS injeções de uma só vez. (Nota positiva: a agulha é pequenina…).

Dois dias depois de desencadear a ovulação foi dia de punção, ou seja, dia de recolher os folículos. Nesse mesmo dia é também recolhido o esperma. E depois… é esperar que a magia aconteça.

E foi também aqui que o pesadelo começou… No dia da punção disseram-me que tinha 17 folículos, o que era muito bom. Viemos animados.

No sábado ligámos para saber como estava a correr o processo e eis que nos despejaram as Cataratas do Niágara pela cabeça. Dos 17 folículos apenas 9 estavam maduros e desses 7 não tinham fecundado. Havia 2 que ainda poderiam estar atrasados, mas o mais provável era que não fosse ocorrer fecundação.

No sábado fiquei em modo dormente, no domingo chorei baba e ranho, na segunda-feira foi a confirmação oficial de que não tinha havido nenhum ovócito fecundado.

E vai daí que pela primeira vez tive um calafrio pela espinha toda e pensei… mesmo com toda a artilharia pesada e toda a ciência, há muitas pessoas que não conseguem ter filhos. E tu podes ser uma delas…

Não é apenas a questão de se o embrião evolui para gravidez ou não… em todo o processo há muitas etapas onde há muitas possibilidades de tudo correr mal.

Na teoria eu já sabia que ia ser muito difícil, mas não estava preparada para provar os amargos reais deste processo.

A primeira batalha foi perdida, agora há que limpar as feridas e preparar as armas para as próximas batalhas e não deixar de acreditar que a vitória será nossa!

Resultado da FIV

Bem, após a consulta o que se chegou à conclusão é que apesar de ter gerado ovócitos eles não tiveram qualidade suficiente para que a fecundação ocorresse.

Depois de repetir de uma análise, suspeita-se agora que possa ter ovários poliquísticos. O meu GO irá agora levar novamente o meu caso a Conselho e por aqui, ficamos a aguardar novidades.

2.a tentativa ICSI

13 de maio de 2018. Pontapé de saída para o protocolo longo. Administrei a primeira injeção de decapeptyl 0,1mg. É uma injeção subcutânea em que temos de juntar um pó e um líquido dissolvente e aplicar na barriga. Fiquei um pouco receosa porque não consegui aspirar a solução na sua totalidade. Espero que a dosagem tenha uma margem de manobra, tend em conta que é administrada por não profissionais.

Agora serão 14 dias de injeções que servem para limpar os ovários e para que eles tenham um período de descanso. Isto em linguagem de leigos.

24 de maio de 2018. Segunda consulta do protocolo longo. Como a menstruação ainda não tinha chegado à hora da consulta (veio nesse dia, mais tarde) vou continuar a fazer decapeptyl.  No dia 27 de maio começo a estimulação e passo a dar não uma, mas duas injeções. Puregon + decapeptyl 0,05 mg.

1 de junho de 2018. Segunda consulta de acompanhamento com análises e eco. Do lado esquerdo há poucos folícolos (2 salvo erro), mas do lado direito existem mais, mas bastante pequenos. Ainda assim, dizem-me que é um cenário normal para o 4.º dia de estimulação.

9 de junho de 2018: Dia de punção. Mais uma etapa ganha. Foram recolhidos 13 ovócitos. O nervosismo era grande porque no primeiro tratamento não houve nenhuma fecundação. No dia seguinte fiquei com a lagriminha no olho, 3 ovócitos fecundaram. Mais um passinho rumo ao sonho.

A técnica que vai ser usada será a Injeção Intracitoplasmática (ICSI). Serão selecionados os melhores espermatezóides e inseridos diretamente no óvulo.

12 de junho de 2018: Dia da transferência. Dos 3 que fecundaram apenas 1 evolui com qualidade. Quando a biológa me informou que ia ser transferido apenas um fiquei um bocadinho desanimada. Afinal é metade da probabilidade de ter sucesso. Mas por outro lado, consegui chegar até aqui o que é uma enorme conquista face ao tratamento interior.

23 de junho de 2018: 11.º de espera. Estes dias são uma luta contra a ansiedade. Tu sabes que tens de relaxar, queres imenso relaxar, mas infelizmente, não consegues controlar a tua cabeça com aquilo que sabes que é o correto. Durante uns dias estive bastante esperançosa. Sentia uns leves cólicas, os seios estavam doridos. Mas depois… nada. Fiquei sem qualquer sinal, perfeitamente normal. Ao 11.º um teste de gravidez já deveria dar positivo. Não resisti e fiz… negativo. Daqui a 3 dias será o veredito oficial. Apesar da esperança ser a última coisa a morrer, no fundo já me estou a preparar para o desfecho.

26 de junho de 2018: 14.º dia, hora de fazer teste. Mais uma ida a Coimbra, desta vez com um nervosinho miúdo ou não fosse o dia de fazer o teste de gravidez. Apesar de ter expectativas moderadas, há sempre aquela ponta de esperança à espera que haja um milagre e que hoje seja o dia. Não foi. Teste negativo. O pior é que não há óvulos congelados, por isso é mesmo recomeçar todo o processo de novo. E começar um novo período de espera.

Drilling ovárico

Depois da segunda tentativa falhada fui encaminhada para fazer um Drilling Ovárico. Trata-se de uma pequena cirurgia em que são feitos vários orifícios nos ovários. O objetivo é potenciar a ocorrência de ovulações com maior qualidade.

A cirurgia só aconteceu a 23 de abril de 2019 porque após o tratamento falhado o meu processo só foi a conselho depois das férias de verão e depois houve greves de enfermeiros que adiaram todas estas cirurgias.

3.ª tentativa ICSI

Novembro de 2019. Depois de quase sucumbir de tanta espera, primeiro pelo drilling, depois pelo início de novo tratamento, eis que finalmente chega a hora. No íncio de novembro início um novo tratamento, protocolo curto com injeções diárias de 250 mg de puregon.

No dia 9 de novembro desencadeio a ovulação e no dia 11 nova punção. A expectativa é moderamente alta. Foram feitas dois tratamentos, feito uma aprendizagem do meu caso e eventualmente corrigidos procedimentos que correram menos bem nos anteriores. Da punção resultaram 13 ovócitos. Agora é cruzar os dedos e esperar…

Que valente soco na cara… De repente sinto-me a cair num precipício frio e escuro até me estatelar na etapa zero novamente. Dos 13 ovócitos apenas 4 estão maduros e desses nehum fecunda. O meu médico fica a olhar para o resultado sem saber bem o que me dizer. Os problemas de fecundação são mais associados ao espermatezóide, mas ele tem os valores todos normais e certinhos. Será a qualidade dos ovários, mas todo o processo de desenvolve normalmente até ao laboratório…

Vamos ver o que nos reserva 2020…

Partida para uma segunda Opinião

Dois anos depois de ter começado tratamentos de procriação medicamente assistida estou a acusar o desgaste. Além de toda a carga psicológica de lidar com as expectativas e com os falhanços, os tempos de espera são aquilo que mais ansiedade me provoca.

Já estávamos a equacionar pedir uma segunda abordagem e depois de mais um tratamento falhado resolvemos procurar ajuda no privado. Não que dúvida da competência dos serviços públicos, mas os tempos de espera são muito longos e tempo é algo que joga contra mim…

Fiz alguma pesquisa na Net e optei pela IVI, em Lisboa. Já tinhamos tido uma primeiro consulta em Setembro, mas depois recebemos a informação do novo tratamento no CHUC e resolvemos aguardar pelo tratamento. Depois de mais uma estimulação em embriões voltámos à IVI para fazer tratamento com eles.

A equipa é atenciosa mas de facto a infertilidade é uma indústria e a sensação que fiquei é que tinha entrado numa linha de montagem. No entanto, as coisas acontecem a um ritmo muito mais rápido. Tempo é a principal coisa que compramos quando optamos pelo privado.

O Dr. Samuel estava bastante optimista que, com algumas correções no processo de estimulação poderia conseguir embriões e no dia 30 de janeiro de 2020 começamos com um novo processo de FIV. Ao processo de estimulção, em laboratório seria feito um tratamento nos óvolos para melhorar o processo de fecundação. Fiz 10 dias de estimulação com pergoveris e após 5 dias adicionei Orgalutran. No dia 11 de fevereiro fiz a punção da qual resultaram 9 ovócitos. Fiquei um pouco desapontada. Ficaria mais confortável com um número mais elevado, porque já sei por experiência que as perdas entre ovócitos e fecundação, e depois da fecundação até aos embriões, são grandes. No dia seguinte fiquei ainda mais apreensiva, porque a fecundação foi muito baixa. Não estava de todo preparada para o desfecho: 0 embriões.

Sim, após todo o investimento de tempo e dinheiro o resultado tinha sido o mesmo. Nem chegámos à transferência, porque nenhum embriões chegou ao D5, ao estado de blastocisto.

Chorei, chorei muito. E fiquei muito cansada, mesmo muito cansada de todo o processo de mais um desapontamento. Nestes momentos a vida parece resumida a um único propósito que acabou por falhar. Foi tempo de parar e refletir.

E agora? Ovodoação!

Voltámos a uma consulta da IVI. Já tinha falado com o meu marido e na minha cabeça já estava decidido que não valia a pena insistir nos meus óvulos. Aliás, logo na primeiro consulta perguntei ao Dr. Samuel o que ele achava, mas na altura ele insistiu em tentarmos primeiro um tratamento com os meus óvulos, que não via razão nenhuma para que não funcionasse.

O Dr. Samuel ainda falou de tentar uma segunda tentativa, com uma pequena alteração, mas sem grande confiança que pudesse resultar. Decidimos partir para a ovodoação.

O primeiro passo passou por fazermos uma consulta com a psicóloga. Este é um assunto que levanta dilemas. Para mim o mais importante era que o meu marido estivesse confortável com o processo. E está. No meu caso poderia haver mais reticências, porque não serão os meus óvulos a resultar num  hipotético bebé. Mas para mim isso não é um dado relevante, por isso avançamos.

Antes de avançarmos ainda fizemos alguns exames de genética, para descartar a possibilidade de termos alguma incompatibilidade que afetasse a fecundação.

Descobri que tenho algumas características que se revelam agressivas (agora já não me lembro bem da descrição), mas que não seria esse o fator impeditivo de fecundação. Ainda assim, essa informação seria útil no processo de seleção de uma doadora.

O processo de ovodoação começou com uma série de exames genéticos por parte do meu marido. E depois repetimos o assinar de uma montanha de consentimentos e autorizações. Preenchi também um documento com a minha descrição física, uma vez que se procura uma doadora que seja, dentro do possível, parecida comigo.

Como alguns exames de genética demoraram umas três semanas a terem resultados, este processo acabou em abril. Depois disto tudo foi esperar que a IVI encontrasse uma doadora.

Já estava a começar a stressar com a espera e eis que em junho finalmente tivemos doadora. Foram menos de dois meses de espera. No sistema público penso que são sensivelmente dois anos. Lembram-se quando disse que no privado se compra essencialmente tempo? Pois, mais um exemplo.

O meu marido foi chamado à IVI para fazer a recolha de esperma e nesse dia soubemos que tinham sido recolhidos à volta de dez óvulos (não me lembro do número certo). Confesso que fiquei um pouco desapontada, porque quando se parte para a ovodoação é para irmos buscar a qualidade que nós já não temos, e esperava mais… Desses óvulos fecundaram 4. Um pouco de decepção, pelo mesmo motivo. E dessas 4 fecundações resultaram 3 blástocitos em D5 que foram congelados.

Gostava de ter tido mais? Claramente! 4 ou 5 blastócistos dariam-me mais conforto por saber que teria mais tentativas, mas pelo menos são de melhor qualidade, aumentando as probabilidades de sucesso.

Ainda se equacionou fazermos a transferência nesse mês, mas depois de ir à clínica viu-se que o meu endométrio já não estava no momento certo e além disso, novo capítulo desta novela mexicana… aparentemente tenho um novo pólipo no útero!

Por isso o plano é no meu próximo ciclo (em agosto) avaliar se realmente se trata de um pólipo. A confirmar-se, primeiro terei de tira-lo e só depois fazer a transferência.

Basicamente queremos um “forno” nas melhores condições possíveis para receber o embrião.

A transferência

Um ciclo em que há apenas uma transferência em embrião é uma coisa bem mais leve do ponto de vista físico.

A partir do primeiro dia do ciclo vai-se articulando com a clínica a realização de ecografias para se apurar o dia ideial da transferência.

Após a transferência foi começar o tempo de espera pelo teste e… voilá… chegámos ao primeiro positivo!